quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

DOSSIERS (TODOS OS NÍVEIS)

Caro aluno do CLC-UFES:
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Seguem os links para baixar os dossiers (material complementar) de todos os níveis. Baixe, imprima e encaderne apenas o referente ao seu nível: como se trata de um material em constante aperfeiçoamento, ele pode ser alterado para o semestre que vem. Caso encontre algum problema ou tenha dificuldade, por favor deixe um comentário.
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ATENÇÃO: Para visualizar corretamente as transcrições fonéticas dos dossiers do Básico 1 e do Básico 2, é preciso instalar a fonte do alfabeto fonético internacional. Pode ficar tranquilo, não tem vírus (o site de hospedagem de arquivos tem verificação automática). O link para baixar a fonte (arquivo levíssimo) está abaixo:
O ideal é você salvar a fonte na Área de trabalho (Desktop) e instalá-la seguindo as instruções da Microsoft (clique aqui) ou consultar o sobrinho faz-tudo de plantão. Não se esqueça de que você deve imprimir o arquivo no computador em que a fonte está instalada!
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ATENÇÃO 2: Nos semestres passados, tivemos problemas com as copiadoras, o que nos obrigou a reimprimir todo o material. Assim, por souci écologique, não disponibilizaremos cópias impressas para xerox. A única maneira de obter os dossiers será realmente por download.
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Básico 3:
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Básico 4:
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Intermediário 1:
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Intermediário 2:
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Avançado 1:
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Avançado 2:
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P.S.: Um pouquinho de vocabulário de informática: baixar um arquivo (ou fazer o download) se diz télécharger. Arquivo de computador se chama fichier (palavra masculina), e não archive (palavra feminina), como os arquivos físicos. Visualizar um arquivo é visualiser (com s mesmo) ou afficher (verbo que, para ser mais preciso, significa "mostrar", "exibir"). Link é lien ("elo"). Fonte (tipo de letra) é police de caratère, e não source (fonte de água, de informação etc.) ou fontaine (bebedouro). E fonte, em francês, significa "ferro fundido", portanto nada de tentar inventar palavras!

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

a mim mesmo

após tanto tatear
aqui e acolá
na busca de algo que não
está lá
cá estou caído
apóstata da fé que nunca tive
mas é aposta que quase fiz
cá estou cá ídolo meu
apóstolo de um não
que é mais que unção
mais que um simulacro
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é a mim mesmo que falo
é amém esmo que falho
e em meu ato fálico
a repetição imperfeita
de uma mente que não
não há seita mentiras doces
não há posta na mesa nenhuma eucaristia
não há teu nome em lista alguma
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não aposto no após
do pó ao pós, enfim sós
apenas nós
que se desatarão
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é a mim mesmo que falo

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Multiculturalismo e burca

Etnocentrismo é algo particularmente imbecil. Mas alguns dos desdobramentos do multiculturalismo (o que é isso?) são meio perigosos: por exemplo, quando alguns intelectuais ocidentais, preocupados em ser politicamente corretos, adotam um relativismo tão extremado que se aproxima do niilismo. Ou, ainda, nos países do chamado 1º mundo, quando certos grupos de imigrantes, dizendo-se marginalizados e oprimidos, querem o direito de quase impor sua cultura ao país em que se encontram. É um pouco o que acontece na França com alguns muçulmanos: na esteira da polêmica que se seguiu à lei que proibia o porte de símbolos religiosos ostensivos nas escolas públicas, houve um movimento de mulheres que reivindicavam o "direito" de usar a burca.
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Abaixo, você confere um trecho da intervenção de uma representante muçulmana em uma discussão realizada no Québec sobre o uso do véu islâmico (voile islamique) em escolas públicas e na função pública. O título dado ao vídeo (Doctorat d'honneur en langue de bois) diz muito sobre a posição da pessoa que o postou: traduzido, dá algo como "Doutorado honorário em embromação". Julgue por você mesmo:

Abaixo, transcrevo um texto da escritora e filósofa Élisabeth Badinter (para saber mais sobre essa autora, clique aqui) sobre as mulheres que, na França, usam voluntariamente a burca. (OK, véu e burca não são a mesma coisa, há uma diferença importante, mas também há semelhanças que não devem ser desprezadas.)
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Lettre à celles qui portent volontairement la burqa
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Après que les plus hautes autorités religieuses musulmanes ont déclaré que les vêtements qui couvrent la totalité du corps et du visage ne relèvent pas du commandement religieux mais de la tradition, wahhabite (Arabie Saoudite) pour l'un, pachtoune (Afghanistan, Pakistan) pour l'autre, allez-vous continuer à cacher l'intégralité de votre visage ?
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Ainsi dissimulée au regard d'autrui, vous devez bien vous rendre compte que vous suscitez la défiance et la peur, des enfants comme des adultes.
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Sommes-nous à ce point méprisables et impurs à vos yeux pour que vous vous nous refusiez tout contact, toute relation, et jusqu'à la connivence d'un sourire ?
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Dans une démocratie moderne, où l'on tente d'instaurer transparence et egalité des sexes, vous nous signifiez brutalement que tout ceci n'est pas votre affaire, que les relations avec les autres ne vous concernent pas et que nos combats ne sont pas les vôtres.
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Alors je m'interroge : pourquoi ne pas gagner les terres saoudiennes ou afghanes où nul ne vous demandera de montrer votre visage, où vos filles seront voilées à leur tour, où votre époux pourra être polygame et vous répudier quand bon lui semble ?
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En vérité, vous utilisez les libertés démocratiques pour les retourner contre la démocratie. Subversion, provocation ou ignorance, le scandale est moins l'offense de votre rejet que la gifle que vous adressez à toutes vos soeurs opprimées qui, elles, risquent la mort pour jouir enfin des libertés que vous méprisez.
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C'est aujourd'hui votre choix, mais qui sait si demain vous ne serez pas heureuse de pouvoir en changer.
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Elles ne le peuvent pas ... Pensez-y !
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Elisabeth Badinter

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Espero que você não considere o argumento de 5º parágrafo como um "muçulmanos, go home". Pelo menos, não é assim que eu vejo a coisa. Seja como for, confira abaixo a participação de Élisabeth Badinter num documentário chamado Qu’est-ce qu’être Français ?, de 2006.

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Nombre, numéro & chiffre

Afinal de contas, qual é a diferença entre chiffre, nombre e numéro? Em português, “número” dá conta de quase todos os sentidos dessas palavrinhas que aparecem para os alunos desde o início do curso, mas cujas diferenças nem sempre são nítidas.
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É coisa simples: desfeito o engano inicial, depois que você se dá conta de que chiffre não tem nada a ver com bois e vacas, e sim com “cifra”, fica fácil compreender por que esse é o termo usado para se referir a estatísticas e dados oficiais – como quando a gente diz “os números do desemprego”: les chiffres du chômage, como no desenho abaixo. Aliás, essa coisa de estatísticas dá o que falar na França (confira aqui). O chiffre d’affaires de uma empresa é o seu faturamento global, o dinheiro que ela movimenta. Chiffre também significa “algarismo”: chiffres arabes (1, 2, 3...) e chiffres romains (I, II, III...). Atenção: chiffre, ao contrário de “cifra”, é masculino. (E não tem aquele seu conhecido que, todo santo fim de semana, larga a mulher em casa para se juntar a um bando de peludos num pé-sujo e passar horas reclamando da escalação do Dunga? O que pode vir a enfeitar a testa dele se chama cornes; e esse mesmo sujeito será chamado de mari trompé – “marido enganado” – ou, pra ficar no popular, cocu – “corno”.)
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A distinção entre nombre e numéro costuma pegar muita gente, mas aí vai um macete infalível: nombre é sinônimo de quantité (aliás, é muito mais usado que quantité). É por isso que dizemos le nombre d’habitants d’une ville, un grand nombre de personnes, le nombre de pages d’un livre e por aí vai. Se você puder colocar quantité no lugar, a palavra certa é nombre. O que significa que Quel est ton nombre de téléphone ? é uma pergunta tão esquisita quanto Quel est ta quantité de téléphone ? No caso de números atribuídos a objetos, documentos, páginas, a palavra certa é numéro (que você vai me fazer o favor de pronunciar marcando bem todas as sílabas: nümêrrô): le numéro de téléphone, de la page, de la salle, de la carte d’identité... Também diremos le numéro 1 250 du Nouvel Observateur (ou seja, a edição 1.250 dessa revista) e le numéro du trapéziste (a apresentação desse artista).
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Mas fique esperto: nem sempre uma pessoa interessada em te ligar mais tarde vai usar esse vocabulário de Básico 1 pra descolar seu contato: não se surpreenda se você ouvir um C’est quoi ton 06 ? (a gíria para celular é zéro-six porque, na França, é assim que começa o número da maioria das linhas de telefonia móvel).
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P.S.: Nada contra botequins e mesas-redondas animadas por cervejas quadradas...

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

Quem te viu, quem te vê, Globinho...

Desde criança, sou apaixonado por carnaval, especialmente pelo desfile das Escolas de Samba do Rio, que sempre acompanhei pela televisão. Aprendi muita coisa com as explicações sobre as fantasias e carros alegóricos, que parecem um barroco viajandão, mas envolvem um trabalho de pesquisa fantástico. Ao contrário do que afirmam alguns chatos que conheço, um desfile pode ser uma verdadeira aula de arte e história.
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Mas, hoje em dia, não consigo assistir à transmissão da Globo sem encher o saco de todo mundo com reclamações que ela conhece de outros carnavais. É que, nos idos das décadas de 80 e 90, os apresentadores contavam histórias e curiosidades que nos permitiam entender da comissão de frente à Velha Guarda. Parece um clichê ser saudosista, mas nesse caso é mais do que nostalgia. Qualquer pessoa que tenha o hábito de acompanhar o Carnaval carioca percebe a evolução do espetáculo, o modo como ele ganhou em riqueza e complexidade artística (ainda que os bons sambas-enredo tenham se tornado mais raros). Mas percebe, também, que o plim-plim anda atravessando o samba há um bom tempo.
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Parece má-vontade ou não sei o quê: é um tal de fazer tomada aérea o tempo todo, de passar a jato pelas alas, de quase estourar champanhe quando dá uma zica num carro alegórico, se preocupando mais em mostrar 500 vezes o mesmo problema e passar em branco o que mais interessa... A impressão é que o jornalismo global tem medo de que o espectador troque de canal ou se atire pela janela caso os apresentadores façam menção a algo de ligeiramente sério ou teçam algum comentário mais relevante ou menos superficial.
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Isso sem falar que a cobertura provavelmente tem fobia a ser tachada de vulgar, e na noite de ontem algumas rainhas de bateria, por exemplo, foram filmadas durante milésimos de segundo. Acho que já deixei bem claro que Carnaval é muito mais do que mulher bonita, mas (acreditem em mim) beleza não é a única coisa que a gente gosta de observar em uma passista: samba no pé tem mais encanto do que uma bunda de fora. (OK, tanto quanto – xiii... minha namorada vai me matar!) Mas, na avalanche neo-puritana dos dias que correm, tudo é pedofilia, machismo e vai saber o que mais.
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Seja como for, nosso carnaval continua, sem sombra de dúvida, o maior espetáculo da Terra. Então vou parar de me queixar porque a quarta-feira de cinzas é muito traiçoeira e despenca na nossa cabeça de uma hora pra outra... e hoje ainda tem muito samba pra rolar!

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

O NOME DO JOGO, de Will Eisner

No ano passado, a grande mídia criou um auê do cão sobre alguns títulos que constavam no acervo de bibliotecas de escolas públicas. O primeiro “escândalo” foi a coletânea de quadrinhos Dez na área, um na banheira e ninguém no gol, de Allan Sieber, Caco Galhardo e outros, uma obra destinada a adolescentes e adultos que tinha sido indicada, por descuido, para alunos da terceira série. (Ou terceiro ano, ou quarta série do novo Ensino Fundamental, sei lá, essas coisas mudam de nome todo dia... e os resultados só pioram.) Realmente, por se tratar de quadrinhos que contêm piadas “cabeludas” e palavrões, talvez não fosse o livro mais indicado para meninos de 9 anos. O próprio Caco Galhardo comentou isso, declarando que sequer fora informado do contrato firmado entre a editora Via Lettera e o governo José Serra e que não recebeu um tostão. (Vale lembrar que o secretário de educação de São Paulo é o nada simpático Paulo Renato, aquele mesmo que estava sucateando as universidades federais e as escolas técnicas, mas isso é assunto para outro dia.)
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Mas como a mídia precisa de lenha pra fogueira, ainda mais quando queimar os outros rende audiência, formou-se um discurso equivocado que partia de premissas toscas como a de que “quadrinhos são feitos para crianças”. Outras obras consideradas impróprias para os estudantes, entre as quais muitos quadrinhos, foram sendo “descobertas”, motivando generalizações apressadas sobre esse tipo de linguagem e uma avalanche moralista de críticos que muitas vezes não ouviam o lado dos autores. O errado, pareciam dizer alguns, eram os quadrinhos, vulgares e de mau gosto. Felizmente, a maré virou e o foco da discussão acabou recaindo onde deveria: no descaso do governo do Estado de SP que, como Paulo Renato mesmo foi obrigado a admitir, não havia encarregado especialistas da seleção das obras.
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Fiz essa introdução um tanto longa para mostrar em que contexto se insere minha resenha de O nome do jogo, quadrinhos do mestre Will Eisner apedrejados pelos conservadores de plantão. O Ministério da Educação havia indicado o livro para alunos do Ensino Médio, mas ele acabou indo parar nas mãos de estudantes de sexta série. Mais um erro (esse, do Governo Federal), ainda que menos grave. Porém, na roda-viva que se seguiu ao “escândalo” de Dez na área..., foi colocado no mesmo balaio: seria uma obra chula, recheada de cenas de violência e sexo, e até insinuação de estupro! Mas vamos pôr os pingos no is: há uma diferença considerável entre uma criança de 9 anos e um moleque de 12; não há nenhuma imagem explícita de sexo no álbum. Aliás, esse está longe de ser o foco da obra. O nome do jogo, na verdade, é uma espécie de ensaio sociológico que mostra como três famílias de imigrantes judeus perseguiram o “sonho americano”, usando o casamento como forma de ascensão social. Certamente, o tipo de livro que contribui tanto para o amadurecimento dos estudantes quanto uma obra de Machado de Assis. E que não contém nada que não apareça na novela das nove.
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O que fica dessa celeuma é o alerta sobre os novos moralismos: existe, hoje, um forte discurso que busca negar aos jovens o acesso a obras tidas como “impróprias”, sob o pretexto de “preservá-los”. Evidentemente, não se trata de expor nossos pimpolhos ao mundo-cão e à pornografia, mas é preciso tomar cuidado com os efeitos dessa suposta proteção, que se mostra ingênua, ao acreditar que as crianças não sabem onde procurar a informação que lhes interessa, e equivocada, ao misturar o erro grotesco da Secretaria de Educação de SP com uma falha na distribuição de um livro que não vai escandalizar ninguém que se dê ao trabalho de lê-lo. E que vale muito a pena, para adolescentes e para adultos.

Coralie Clément

Você conhece Coralie Clément? Cantora de "safra" recente, de quem tenho dois discos bastante diferentes entre si (Salle des pas perdus e Bye bye beauté - se alguém conseguir os mais recentes, C'est la vie e Toystore, podemos negociar muito material pirata), ela empresta sua voz aveludada a canções escritas por seu irmão Benjamin Biolay. Este último, aliás, é um dos nomes fortes da nova geração da música francesa e participou do retorno de Henri Salvador aos estúdios e aos palcos.
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Aqui você confere duas canções de Coralie: Samba de mon coeur qui bat, que está na trilha sonora do filme Alguém tem que ceder (Something's gotta give, com Jack Nicholson), e L'ombre et la lumière. A letra, você sabe: está nos comentários.
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domingo, 7 de fevereiro de 2010

OS APÓSTROFOS EM FRANCÊS

Uma das características mais marcantes do francês é a enorme frequência do apóstrofo. Curiosamente, ao longo de quase sete anos como professor, percebo que é um aspecto que passa despercebidos a muitos alunos. Meus pupilos normalmente esquecem de colocar essa vírgula flutuante onde ela é obrigatória ou a escrevem onde ela não poderia estar. E, normalmente, cometem esses erros opostos no mesmo texto!
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Mea culpa: no material didático, o uso do apóstrofo só é explicado de maneira sistemática quando da apresentação dos artigos definidos e dos pronomes-sujeitos. E apenas na primeira unidade do primeiro semestre. O assunto não é retomado depois, até porque aparecem outros temas, mas o fato é que a ortografia é um ponto bastante negligenciado pela maioria dos livros de língua estrangeira. O resultado é que, na falta de instruções mais detalhadas, os alunos seguem a intuição, e essa, creio eu, é orientada pelo conhecimento do inglês. Se, nesse idioma, a escolha entre I am e you are ou I’m e you’re, por exemplo, depende do grau de formalidade do texto, assim também deve ser em francês. Imagino que os alunos pensem assim. Acabam esquecendo que, no início do curso, o professor disse que era proibido escrever, dizer ou mesmo pensar uma monstruosidade como je habite, em vez de j’habite. Além disso, um mínimo de leitura deixa claro que esse tipo de coisa nunca acontece, em nenhum tipo de texto. Meia culpa: culpa compartilhada...
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Bom, mas se o problema é falta de explicação sistemática, lá vai: o apóstrofo é de uso obrigatório quando a vogal final de certas palavras encontra a vogal inicial ou o h mudo da palavra seguinte, e serve para marcar que essa vogal final não é pronunciada. Essa queda de uma vogal se chama “elisão” (élision). Aqui, me refiro especificamente aos seguintes vocábulos: je, me, te, se, le, la, ne, que e de, que viram j’, m’, t’, s’, l’, n’, qu’ e d’. SISTEMATICAMENTE. OBRIGATORIAMENTE. E exatamente porque se fala assim. Se, em vez de pronunciar j’ai (jé ou jê), você soltar je ai (je-é), não vai dizer “eu tenho”, e sim je hais (“eu detesto”, do verbo haïr). Isso seria... detestável.
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Não tenha vergonha de usar tantos apóstrofos quanto for necessário: J’imagine qu’André n’a pas de problème d’argent, parce qu’il t’a acheté un collier en or (“Imagino que André não está com problema de dinheiro, porque ele comprou um colar de ouro para você”). Desculpem o exemplo meio esquisito, não estava muito inspirado.
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Algumas observações importantes:
Si só se torna s’ diante de il. Lorsque (“quando”) só sofre elisão antes de il(s), elle(s), on, en e un(e) – nesse caso, escreve-se lorsqu’. Com quoique (“embora”, “ainda que”) é quase a mesma coisa (quoiqu’), com exceção de enQuoique en ce moment... (“Embora neste momento...).
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O adjetivo possessivo feminino (ma), quando se encontra diante de uma vogal ou de um h mudo, não se transforma em m’, e sim em mon: ou seja, embora la + amie fique l’amie (“a amiga”), ma + amie = mon amie (minha amiga). Até porque mamie significa “vovó”.
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Na regra ortográfica, NUNCA se usa apóstrofo antes de consoante. Mas você já deve ter visto isso, até nas letras de música que eu posto aqui, e as do Yves Jamait são o melhor exemplo. Bom, trata-se de uma representação da língua falada, na qual costumamos “engolir” o e não acentuado e mesmo algumas consoantes ou algumas palavras que, em princípio, deveriam ser pronunciadas. Assim, se você se deparar com algo como i m’dit qu’y a pas d’souci mais j’crois pas qu’tu sois d’accord, saiba que se trata de um modo de retratar a maneira coloquial de pronunciar a frase il me dit qu’il n’y a pas de souci mais je ne crois pas que tu sois d’accord (“ele me diz que não tem problema, mas eu acho que você não concorda”). Mas lembre-se: se você escrevesse assim numa prova, seu texto pegaria sarampo!
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E pelamordedeus: o artigo definido plural (les) não vira l’ nunca-jamais, em hipótese nenhuma! Da mesma forma, não faz sentido usar apóstrofo onde não existe uma vogal para cair, como é o caso do artigo indefinido masculino (un): escrever un’hôtel, em vez de simplesmente un hôtel, é um atentado ao bom senso. E como chatice pouca é bobagem, vou insistir: também não se usa apóstrofo com o artigo indefinido feminino (une).
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Concluindo: acima, falei mais de uma vez sobre “h mudo” (h muet). Explico: não é que exista alguma situação em que o h tenha som, mas algumas palavras começadas com essa letra não admitem élision nem liaison (aquele fenômeno no qual les hôtels se pronuncia “lêzôtél”). Esse h aspiré está devidamente indicado no dicionário com um asterisco antes da palavra ou com alguma marca na transcrição fonológica. E para aprender... só estudando. Assim, mãos à obra!

sábado, 6 de fevereiro de 2010

Avez-vous déjà vu... ?

No blog do Marcos, meu colega no Centro de Línguas, tem uma seção com uns vídeos muito engraçados chamados "Avez-vous déjà vu... ?". Normalmente, são animações tratando de situações absolutamente bizarras, do tipo "Você já viu porcos-espinho brincando de teatro de sombras?", e que sempre rendem boas risadas. Para conferir o que Marcôs, le Robert disponibilizou para a gente, clique aqui.
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P.S.: Tentei resistir à tentação, mas não deu. Gostaria de lembrar que déjà vu, cuja tradução literal é "já visto", quando aparece em frases como C'est du déjà vu, significa "clichê", "coisa batida". Assim, se você quiser dizer, por exemplo, que o filme que você viu no domingo passado não te surpreendeu em nada, você pode dizer Que du déjà vu ("Só clichê"). Não entendeu esse que? Clique aqui.
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Já aquela impressão de que estamos vendo algo pela segunda vez se chama déjà-vu (com hífen) ou paramnésie (em grego, "mémória paralela").

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Trem da Vida

Ontem, revi um de meus filmes favoritos: Train de Vie. O título em português é uma tradução literal do original, e é bastante apropriado para essa comédia que relata as aventuras de uma aldeia de judeus situada na França ocupada pelas tropas nazistas. Ao saber da chegada das tropas alemãs, que deportariam todos para campos de concetração, o Conselho dos Sábios se reúne e adota uma estratégia original: organizar a própria deportação, criando um falso trem nazista para escapar até a Palestina. Alguns membros da comunidade se deveriam interpretar os nazistas, ao passo que outros fariam o papel de prisioneiros. E eles ainda têm que escapar de uma Resistência Francesa trapalhona, que tenta o tempo todo descarrilhar o suposto comboio nazista.
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Mas é interessante notar que, em francês, train de vie é uma expressão um pouco antiga que significa "modo de vida". Se o título se referisse simplesmente a um "trem da vida", o título seria Le train de la vie (repare que o artigo antes de "vida" tem o mesmo efeito que teria em português). Train, aliás, tem como um de seus sentidos "maneira de ir, de evoluir". A expressão en train significa "em andamento", por isso mettre en train e, consequentemente, mise en train, podem ser traduzidas com os neologismos (um tanto desajeitados e deselegantes, a meu ver) "operacionalizar" e "operacionalização". (Em outra ocasião, já me dediquei a essas expressões com mise.) E não é por acaso que a locução être en train de + infinitif é uma equivalente do nosso "estar + gerúndio" - só que eu já falei bastante sobre isso em um texto anterior.
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Voltando à história do falso trem nazista: o que resulta desse insólito ponto de partida é um filme delicioso, repleto de humor, delicadeza e emoção, com uma fotografia belíssima. Tratando-se de um filme de 1998, pode não ser assim tão fácil de encontrar nas locadoras (eu mesmo só pude revê-lo porque meu primo o baixou), mas sem dúvida vale a pena procurá-lo. Abaixo você confere o trailer (sem legendas, sinto muito) e uma de minhas cenas preferidas, em que o louco, Schlomo, intervém em uma violenta discussão acerca da existência de Deus (com legendas em português).